I Tessalonicenses, 1: 6 a 10

E vós fostes feitos nossos imitadores e do Senhor, recebendo a palavra em muita tribulação, com gozo do Espírito Santo, de maneira que fostes exemplo para todos os fiéis na Macedônia e Acaia.

Paulo leva muito a sério os ensinamentos de Jesus. Deste modo, compreende que do mesmo jeito que Jesus se fez um com o Pai, nós também poderemos nos fazer um com o Cristo e também um com Deus. Esta é uma prerrogativa que é dada a todos nós.

Assim, busca incessantemente imitar a Jesus a quem ele tem por Senhor. Buscou viver isto de tal modo, que mais tarde pôde afirmar:

Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim.1

Aqui ele exalta a coerência dos discípulos de Tessalônica, pois estes tendo recebido o Evangelho, a palavra em muita tribulação, o fizeram com gozo do Espírito Santo, isto é, com alegria e compreensão de tal forma, que entendendo a essência da Mensagem buscaram imitar Paulo e o Senhor. Ou seja, entenderam a importância da vivência dos ensinamentos que recebiam, e tinham não só Paulo, mas o próprio Jesus como modelo.

Cabe aqui analisar algumas expressões minuciosamente buscando a aplicação das lições em nosso dia a dia.

Nossos imitadores e do Senhor – É importantíssimo termos um modelo. Os Espíritos nos informam na questão 625 de O Livro dos Espíritos que Jesus é o nosso guia e modelo.

Temos deste modo, de refletirmos sobre esta colocação e entender que a verdadeira “religião espírita” é a imitação de Jesus. É certo que a distancia que nos separa em matéria evolutiva, é imensa, todavia temos que colocar o objetivo na frente e buscarmos alcançá-lo com determinação e perseverança. Haverá momentos de dores, de lágrimas, e até mesmo de quedas, mas o que nos faz diferente dos demais é a capacidade que podemos ter de nos erguermos e seguir adiante rumo ao objetivo para o qual fomos criados.

Todas as grandes almas que serviram de exemplo para humanidade assim fizeram, e se em determinado momento erraram, pois só Jesus foi perfeito, souberam fazer do erro ponte para integração com o Eterno.

Sejamos imitadores de Paulo, de Francisco de Assis, de Chico Xavier, de Madre Teresa e de outros que do mesmo modo buscaram imitar o Senhor. E não esqueçamos que o objetivo de nossa vida é a evolução, que deve ser compreendida como espiritualização, evangelização, ou mesmo, educação para o entendimento do Cristo Jesus e de Deus nosso Pai e Criador.

recebendo a palavra em muita tribulação… - A palavra aqui é o mesmo que Evangelho, pois este é a “palavra de Deus” para cada um de nós. Se o Velho Testamento representa um pedido do homem para Deus, o Novo é a resposta de Deus para o homem.

Todavia, se a Boa Nova é uma “palavra” de alegria, a sua vivência requer muita determinação e perseverança no objetivo maior, pois o cerne de sua mensagem é a destruição do interesse pessoal em favor do coletivo, é o sacrifício de si mesmo em favor do outro.

A tribulação dos tessalonicenses, de Paulo e dos primeiros cristãos foi principalmente a incompreensão da religião ortodoxa e dominante na época. Incompreensão esta que se materializou em muitas dores para os primeiros seguidores do Meigo Nazareno. Hoje já não temos as mesmas dificuldades; no país em que vivemos há uma grande liberdade de manifestação religiosa, todavia, qual de nós não tem as suas tribulações na busca da vivência evangélica, seja na convivência com a multiplicidade de filosofias existentes até mesmo entre os adeptos do Cristo e de Kardec, ou, seja na luta íntima do dia a dia? Porém, não nos esqueçamos, a luz só se manifesta nas trevas, sem a existência destas, como refletir a revelação que vem do Alto?

Desta forma entendemos que a tribulação é essencial para o aperfeiçoamento individual, são nas provações mais ríspidas que são forjados os maiores caracteres.

com gozo do Espírito Santo… - Podemos entender a expressão Espírito Santo no Evangelho de dois modos principalmente. Representa o Espírito que já se santificou através da experiência evolutiva; ou, em determinados casos o grupo de Espíritos já harmonizados a Deus e que trabalham para o Cristo na implantação da Verdade Universal no coração das criaturas.

Em última instância, em nosso planeta Terra, Jesus é o coordenador do trabalho do Espírito Santo em todas as esferas. A trindade Deus – Jesus –Espírito Santo, ou, Pai – Filho – Espírito Santo, representa dentro desta ótica a harmonia de trabalho, do Criador, daquele que é o Eleito do Orbe, o Cristo, e o grupo de Espíritos que já ajustados à vontade de Deus trabalham como Co-criadores na harmonização deste Orbe, seja num plano maior ou menor, de acordo com a possibilidade de cada um.

Com gozo do Espírito Santo conforme expressou o Apóstolo da Gentilidade, significa a alegria daquele que trabalha com amor. O seguidor do Evangelho tem por diferencial justamente a alegria de servir. Mesmo nos momentos de maior contrariedade a alegria deve ser o sentimento sempre presente na intimidade de cada um, pois a dificuldade não pode de modo algum ser encarada como castigo, e sim como promoção a uma oportunidade nova de trabalho em favor do Cristo.

de maneira que fostes exemplo para todos os fiéis na Macedônia e Acaia. – Segundo orientação da espiritualidade superior, o exemplo não é uma forma de educação, mas a única.

Nós, conhecedores do Evangelho, e que nos dizemos seguidores do Mestre Galileu, não podemos esquecer que temos constantemente responsabilidade de educadores na pauta de nossas obrigações diárias.

Eis que o semeador saiu a semear…2

Portanto, em todos os momentos temos o compromisso de educar, não esqueçamos, deste modo, do exemplo.

Paulo ressalta aqui o comportamento de fidelidade dos seguidores de Tessalônica, e destaca como isso foi importante, pois serviu de exemplo para várias outras comunidades do Evangelho.

Se queremos ser divulgadores da Doutrina e do Evangelho, temos sim que estudar Kardec, as lições de Jesus, e sermos fiéis a eles na oratória; porém, jamais esqueçamos das consequências morais que devem resultar desta possibilidade. O seguidor fiel é aquele que vive o que prega, como Paulo nos lembra, o justo viverá da fé3.

Porque por vós soou a palavra do Senhor, não somente na Macedônia e Acaia, mas também em todos os lugares a vossa fé para com Deus se espalhou, de tal maneira que já dela não temos necessidade de falar coisa alguma; porque eles mesmos anunciam de nós qual a entrada que tivemos para convosco, e como dos ídolos vos convertestes a Deus, para servir ao Deus vivo e verdadeiro, e esperar dos céus a seu Filho, a quem ressuscitou dos mortos, a saber, Jesus, que nos livra da ira futura.

Diante do já exposto até aqui pouco temos que comentar sobre este trecho. Para não cairmos em repetições desnecessárias vamos comentar apenas alguns pontos que achamos mais importantes.

O comportamento dos tessalonicenses que a princípio serviu de exemplo às comunidades da Macedônia e da Acaia, com o tempo se estendeu em matéria de influência de tal modo, que o Apóstolo fala dela de uma forma ampla, em todos os lugares, a nos mostrar, como já salientamos, a importância do exemplo, e como um ato nosso pode refletir de maneira incalculável por nós em vários locais.

Como nos afirmou o próprio discípulo de Gamaliel, um pouco de fermento leveda toda a massa4. Se ele usou desta sentença para alertar aos gálatas a respeito dos judaizantes que os fazia retroceder no Evangelho, podemos também usá-la em sentido positivo com referência aos exemplos nobres, e sua influência nos outros.

e como dos ídolos vos convertestes a Deus, para servir ao Deus vivo e verdadeiro… - Paulo destaca aqui a mudança realizada pelos tessalonicenses. Para tal ele usa a palavra convertestes. Converter é realizar em si uma mudança profunda, uma transformação; não é simplesmente trocar de lado, mas mudar com determinação e consciência do que se está fazendo. Paulo na estrada de Damasco se converteu ao Cristo, nós muitas vezes trocamos de religião, mas nem por isso nos convertemos, já que valorizamos mais as aparências exteriores do que propriamente o sentido profundo da filosofia esposada.

Esta palavra, conversão, deve ser por nós muito bem analisada, pois a proposta essencial da doutrina espírita é a nossa autoiluminação, e isso se dará de forma mais tranquila e segura pela nossa conversão ao Evangelho.

É bom que se entenda que a justiça antecede ao amor, a disciplina a espontaneidade. Assim, quando buscamos o conhecimento, a ciência, vamos comparar, analisar, esmiuçar, este é o primeiro passo; porém, a conversão se dá no momento em que sentimos e aderimos à mensagem de tal forma que naturalmente a vivenciamos. Por isso Paulo afirma que a conversão só se dá pela fé, que é o estado de amadurecimento tal em que a criatura espontaneamente vive a fidelidade. Aliás, a palavra fé é a tradução do grego pistis, que expressa por si só, fidelidade; não se trata só de crer de uma forma passiva e sem comprometimento com a mudança interior.

Eles se converteram dos ídolos a Deus. Como gentios eram adoradores de várias entidades, não tinham uma crença firme, substanciosa. A partir da recepção da Boa Nova, transformaram-se através de uma atitude cristã, deixando as ilusões do mundo em favor de uma vida mais ajustada aos princípios de espiritualidade.

Eles alcançaram uma compreensão tão ampla da mensagem evangélica que passaram a servir a Deus conforme anotação do missivista; servir, e não ser servido conforme normalmente queremos. E o que é mais importante, servir ao Deus vivo e verdadeiro, pois aqui cabe mais uma reflexão: a quem temos servido? A que Deus temos adorado? Porque se hoje já entendemos a mensagem do Deus único, nem por isso deixamos de adorar aos deuses dinheiro, poder, beleza, num constante culto ao corpo ou às conquistas referentes aos cargos mundanos e transitórios.

e esperar dos céus a seu Filho, a quem ressuscitou dos mortos, a saber, Jesus, que nos livra da ira futura. – Aqui novamente Paulo destaca o valor da esperança, a esperar dos céus a seu Filho. Mais uma vez diferenciando Deus, que é o Pai, de Jesus, que é o Filho.

Aquele que trabalha com tranquilidade e consciência os valores espirituais espera dos céus naturalmente o atendimento de suas expectativas espirituais. Por estar certo de que faz o melhor dentro de suas possibilidades, fica também tranquilo, isto é, sem ansiedade quanto ao que virá do Alto aqui representado pela palavra céus, no plural, indicando a infinitude das possibilidades.

O que espera dos céus este que assim faz? A seu Filho, diz o apostolo, representado aqui tudo o que Jesus significa em matéria de conexão ou ajustamento com o Altíssimo.

Deus, em seu aspecto Lei, ressuscitou Jesus. Como a Lei de Deus é Unidade ela age do mesmo modo para com todos, assim todos seremos ressuscitados, pois a imortalidade da alma é uma prerrogativa para todos, e a unificação em Deus é realização finalística para o Espírito que se aperfeiçoa sempre.

Não esqueçamos que estas epístolas paulinas eram mensagem do próprio Cristo através de Estevão para que Paulo, por via mediúnica, recebesse e encaminhasse para os cristãos daquele tempo5, mas com conteúdo a ser minuciado pelos seguidores do Mestre de todas as eras de conformidade com a exegese possível a cada um a seu tempo.

E o Apóstolo continua…

Jesus, que nos livra da ira futura. – A ira de Deus, que Paulo cita também em outros textos6, representa a ação da Lei de Deus que julga o passado no presente, e este no futuro. Ira dá um sentido de consequência negativa, pois se refere a uma semeadura imprevidente. Se é futura, é porque vai ainda acontecer, portanto está vinculada a nossa ação no presente, que pode ser modificado. Jesus é o libertador das consciências, pois promove a ascensão desta para Deus, deste modo, Jesus nos livra da ira futura, na medida em que, aderindo às suas propostas realizamos a conexão que nos religa ao Criador, libertando-nos assim de momentos de dor em futuras manifestações.

1 Gálatas, 2: 20

2 Mateus 13:3

3 Cf. Habacuque, 2: 4; Rom, 1: 17; Gl, 3: 11; Hb, 10: 38

4 Gálatas 5:9

5 Paulo e Estevão, cap VI, 2a parte.

6 Cf. Romanos, 1:18 ; Efésios, 5:6; Colossenses, 3:6 e 1 Ts, 2:16.