I Tessalonicenses, 2: 5 a 8

 

Porque, como bem sabeis, nunca usamos de palavras lisonjeiras, nem houve um pretexto de avareza; Deus é testemunha. E não buscamos glória dos homens, nem de vós, nem de outros, ainda que podíamos, como apóstolos de Cristo, ser-vos pesados; antes, fomos brandos entre vós, como a ama que cria seus filhos.

Paulo jamais se envaideceu com a sua condição de apóstolo, muito pelo contrario. Tinha consciência de sua missão, todavia sem se valorizar pessoalmente. São dele essas palavras:

A mim, o mínimo de todos os santos, me foi dada esta graça de anunciar entre os gentios, por meio do evangelho, as riquezas incompreensíveis de Cristo1

Também, nunca quis tirar proveito para si próprio. Se continuasse na sua posição de fariseu, doutor da lei, substituto de Gamaliel, teria todos os louros do mundo, e excelente condição material. Porém, deixou tudo isso pela conversão ao Cristo.

Não temos hoje a idéia do que significou para ele em termos de perda quanto aos valores do mundo a sua opção pela Boa Nova, pois hoje divulgar os valores do espírito dá até status, porém àquele tempo não era assim, e ele saiu da condição de líder de uma facção dominante, para simples operário da construção de um edifício o qual ainda estava sendo lançado as suas bases. Como então acusá-lo de avaro?

É muito bom poder dizer com sinceridade de consciência, que Deus é testemunha de nossas intenções mais íntimas, e do desinteresse das mesmas, e ele podia assim dizer: Deus é testemunha.

Jesus já dissera da impossibilidade de servir a Deus e ao mundo ao mesmo tempo, pois ou se agrada a um ou ao outro, ninguém pode servir a dois senhores2.

Paulo era conhecedor desta realidade e por isso jamais quis o elogio ou a glória dos homens fossem estes quem fossem; pois sabia que os discípulos sinceros do Cristo não elogiavam por saberem da responsabilidade que tinham, e porque o mérito não eram deles e sim do Senhor que eles representavam. E quanto aos outros homens, os ligados ao mundo, já dissemos, não interessa ao servidor do Evangelho a sua opinião e sim amá-los conforme a orientação do Mestre.

Na condição de liderança que exercia, podia usar de privilégios tanto materiais, quanto de desejar facilidades devido a um suposto prestígio, pois era um apóstolo indicado pelo próprio Cristo a serviço de Deus; todavia abriu mão de tal prerrogativa, pois não era um profissional da fé e sim um irmão que buscava também mais acertar do que errar. Este exemplo tanto de Paulo quanto de outros grandes apóstolos do Senhor3, merece ser por nós avaliado, seguido, e divulgado entre os irmãos de fé.

Através do livro de Atos dos Apóstolos, e também da já citada obra de Emmanuel, Paulo e Estevão, tomamos conhecimento que Paulo aprendeu o ofício de tecelão. Era comum à época, entre os judeus, o pai exigir que os seus filhos aprendessem um trabalho mecânico afim de num momento de maior necessidade poder ganhar o seu sustento de forma honesta. Paulo assim fez, quando afastou-se do templo, e por não achar justo viver às custas da fé que agora esposava, exerceu com dignidade seu ofício de tecelão não sendo assim pesado aos companheiros de fé.

Importa-nos mais uma vez destacar o sentimento de afeto que todo servidor do Cristo deve ter uns em relação aos outros:

fomos brandos entre vós, como a ama que cria seus filhos. Dispensa qualquer comentário esta colocação, pois a afabilidade e a doçura devem ser características básicas daquele que tem Jesus como guia e modelo para sua própria conduta.

Assim nós, sendo-vos tão afeiçoados, de boa vontade quiséramos comunicar-vos, não somente o evangelho de Deus, mas ainda a nossa própria alma; porquanto nos éreis muito queridos.

É confirmado aqui os laços afetivos que uniam o apóstolo aos seus seguidores, assim nós, sendo-vos tão afeiçoados. Este é realmente o diferencial do seguidor do Evangelho, o sentimento de carinho, de atenção, de cuidado, com tudo o que realiza e com todos com quem convive.

De boa vontade quiséramos comunicar-vos, não somente o Evangelho de Deus… Boa vontade expressa o sentimento mais profundo de desejo de realizar algo. Dizia nosso querido Leão Zállio, um dos nossos primeiros orientadores da Doutrina e do Evangelho, quando ainda encarnado, que não basta a vontade, temos de ter boa vontade, a definir aquele sentimento característico do servidor do Evangelho que o Cristo qualificou de “segunda milha”, isto é, trata-se de ir além do que é pedido, de dar um pouco mais expressando o amor além da justiça.

Este era o sentimento dominante de Paulo quando se tratava de divulgar o Evangelho, que como já explicamos, ele dizia ser de Deus.

ainda a nossa própria alma; porquanto nos éreis muito queridos. Ministrar o Evangelho segundo o entendimento superior de Paulo era não somente comunicar-lhe aos seus adeptos, mas dar a própria alma pela causa, que em se tratando do Evangelho, era o bem do semelhante sob o ponto de vista de mais espiritualidade.

É muito comum nos meios religiosos tradicionais a afirmativa de que os grandes iniciados deram a vida por nós, no sentido de morrer por nós. Essa não é a grande questão, pois morrer por nós significando desencarnar, para aquele que tem certeza da imortalidade da alma e a consciência tranquila do dever cumprido, não é nenhum sofrimento. Os grandes avatares, os que tiveram grandes realizações sob a ótica espiritual, têm mérito, justamente por ter vivido por nós, ou seja, vivenciaram cada momento com amor, matando o interesse pessoal em favor da universalidade do Bem.

Paulo assim fez pela divulgação da Boa Nova de Deus e pelo bem daqueles que eram seus seguidores e também conversos ao Evangelho.

1 Efésios, 3:8

2 Cf. Mteus, 6: 24; Lucas, 16: 13

3 Assim também fizeram Pedro, João, Francisco de Assis, Chico Xavier, entre outros que jamais quiseram ser pesados financeiramente aos seguidores de suas propostas de religiosidade.